sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Eu também vesti a camiseta!!


Sakineh, uma mulher como nós

Adoçantes não calóricos. Massagem com compressas de ervas quentes. Máquinas high-tech para eliminar a celulite. Modelador térmico para criar cachos naturais. Esmalte de tratamento para unhas frágeis. Clareador de manchas com ácido bio-hialurônico. Hidratante bloqueador de radicais livres. E sigo folheando uma adorável revista feminina, que nos conduz a um mundo onde tudo é lindo, glamouroso e caro, mas sonhar não custa nada, e viro mais uma página, e outra, enquanto penso: uma moça chamada Sakineh Mohammadi Ashtiani pode morrer apedrejada a qualquer momento por um suposto adultério cometido anos atrás.
Mulheres se candidatam à presidência, dirigem empresas, pedem o divórcio, viajam sozinhas, investem na sua vaidade, mas nenhuma dessas conquistas pode nos orgulhar enquanto ainda houver o costume de enterrar uma criatura no chão com apenas a cabeça de fora para que leve pedradas de diversos homens — e não podem ser pedras GG, tem que ser as de tamanho M, pois exige-se que o suplício seja longo. Que tom de gloss será conveniente para assistir ao badalado evento?
Sei que há diversas outras modalidades de desrespeito aos direitos humanos, inclusive no Brasil, mas neste momento estou vestindo a camiseta da Sakineh. Quero falar sobre o ato primitivo de se apedrejar uma mulher na cabeça até a morte. Não discuto o motivo torpe da condenação, pois nem que ela tivesse matado alguém, em vez de simplesmente ter feito sexo com alguém, seria justificativa. Não há justificativa para a brutalidade. É a lei do Irã, é a religião do Irã, é a tradição do Irã, e daí? Quando meu estômago embrulha, é sinal de que algo bem perto de mim está acontecendo. Distância só existe quando a gente racionaliza, o sentir unifica. O Irã faz parte do mundo em que eu vivo. O meu tempo e o da Sakineh são o mesmo. Somos contemporâneas. Ela não é um personagem, existe. Tem filhos. E se a mobilização internacional não surtir efeito, em breve será enterrada até a altura do busto, com os braços presos para não poder proteger o rosto.
O que dói, mais do que tudo, é reconhecer que avançamos tanto e ainda não conseguimos atingir um grau de humanidade que seja comum a todos, homens e mulheres de qualquer lugar e de qualquer crença. O que podemos fazer por Sakineh? Rezar para que ela seja enforcada, que é o plano B. Ufa, seria um alívio.
Há uma petição circulando pela internet. Acredito tanto na eficiência desses abaixo-assinados como acredito em creme antirrugas, mas volto a dizer: sonhar não custa nada.
Eu já assinei. Agora vou passar meu incrível tônico de renovação celular “future solution”, pois, como qualquer mulher, adoro cuidar da minha pele.
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Texto de Martha Medeiros, publicado no dia 11/08/2010 - no Jornal Zero-Hora.
Foto: Getty Imagens
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Um ótimo e justo findi à todos!!

4 comentários:

Marcia disse...

Isto é realmente revoltante indignante...mas se o que eu posso fazer é só assinar então já fiz...
Vou também te pedir licença para divulgar na íntegra este post em meu blog...
beijos pra ti!!!

Fernanda Eick disse...

Claro amiga!!
Uma ótima iniciativa.
Gde abraço!!

Anônimo disse...

Assinei e tb coloquei nos meus blogs o endereço da petição..
Para Deus nada é impossível.
bjo

Claudiene Finotti disse...

Oi Fernanda!
Esse texto é realmente coerente. Por que não deveríamos nos preocupar só porque a vítima é longe geograficamente falando? Afff... o duro é esse martírio acontecendo aos poucos e ninguém poder fazer nada. Infelizmente não creio que ela será salva. Talvez façam tudo inesperadamente, para que não dê realmente tempo para atitude alguma. Vermes esses homens que atiram pedras.

Gostei do seu espaço, estou seguindo.

Bjos.

Clau